— O que bebeste tu, Lúcia? perguntei-lhe inquieto.
— Sofro do estômago, bebi um gole de kirsch, respondeu com a voz trôpega.
— Que extravagância!
Ela cortou-me a palavra com um beijo de fogo; escaldou-me da lava que corria-lhe do corpo; mas de repente repeliu-me bruscamente escondendo o rosto nas mãos:
— Não posso! É mais forte do que eu!
Soluçava como uma criança; riu depois como uma louca.
Conheci então a verdade; Lúcia estava embriagada.
A sua saída repentina fora um ato de desespero para vencer o gélido espasmo que a marmorizava. Tinha quase esvaziado uma garrafa de kirsch. Acreditei enfim na sinceridade da repugnância de Lúcia; renunciei de uma vez ao meu desejo. Sentia profunda compaixão por essa mulher. O seu pranto me enterneceu; chorei com ela.
O abalo moral foi-lhe dissipando a embriaguez, até que adormeceu profundamente sobre o meu peito.
Quando acordou, Lúcia percorreu algum tempo com os olhos o aposento, como se coligisse os vestígios esparsos de recordações esvanecidas pelo sono, até que a idéia do que se havia passado desenhou-se lúcida no seu espírito. Então volveu para mim o olhar humilde juntando as mãos com uma expressão suplicante.
— Logo mais terei forcas! balbuciou ela. Era a primeira vez depois de tanto tempo; e não pensei que me faltasse o animo.
— Não, Lúcia; nunca mais!