Quando a noite estava bonita, íamos os três até a Caixa-d'água, ou até os Dois Irmãos, gozar da frescura das árvores e da água corrente. Lúcia reclinava-se ao meu braço, e eu dava a outra mão livre a Ana. Assim caminhávamos, quase sempre mudos e silenciosos, contemplando a beleza das cenas que se desenrolavam aos nossos olhos, ou absorvidos em nossos pensamentos íntimos. Quando Ana soltava a minha mão para correr diante de nós com a inquieta travessura de sua idade, Lúcia erguia-se na ponta dos pés, e suspirava-me ao ouvido alguma palavra terna, alguma doce confidência de sua alma.
— Sou feliz! dizia-me uma noite, muito feliz! Deus se compadeceu de mim dando-me essa força de vontade que me faz separar de minha vida o tempo que não vivi. Ele me aparece como um sonho, como uma nuvem sombria que se vai sumindo.
Outras noites nos sentávamos sobre as pedras do caminho, e eu, respondendo às perguntas de Ana, falava-lhe da natureza, das flores, das árvores, das estrelas, com o entusiasmo e a poesia que as belas criações de Deus despertam em nossa alma.
— Fala ainda! balbuciava Lúcia ao meu ouvido, quando me calava. Fala! É tão bom ouvir-te.
Era unicamente aos domingos que eu tinha um momento de estar só com Lúcia. Então ela tomava-me a cabeça que escondia no seio com um anelo de ternura; fechava-me os olhos, e eu sentia os seus lábios roçarem o meu rosto, tão de leve como as tranças de seus cabelos; por fim olhava-me, ora sorrindo, ora séria e absorvida nos seus pensamentos.