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XV


MARÁNOS E A PRIMAVERA




Já tres luas passaram, e com elas
Dezembro e as frias chuvas; o Janeiro
E essas noites de lucidas estrelas
E de luar divinamente claro.
Passára o Fevereiro; e as andorinhas
Tinham trazido Março ... As grandes aguias,
Doidas de luz, pairam, no ar, sósinhas,
Fitando de alto a terra ... E a branca neve,
Indiferente e fria em seu alvor,
Por milagre do sol resuscitado,
Acorda para a vida e para o amôr
Em cascatas de risos e de lagrimas.
Vae-se a humidade em nevoa; foge a sombra;
Nasce a canção e o beijo ... Que alegria
De saudavel mulher adolescente,
Sorri nas fontes, no ar, na luz do dia!
E como os passarinhos ao nascer,
As árvores já têm penugens verdes,
Mas ainda tão subtis que deixam ver
As angulosas formas dos seus ramos.
E da vasta distancia circular,
Vem uma aurora, um halo de verdura,
Como divino incêndio a irradiar
Seu radiante viço enverdecido...

E uma embriaguez sagrada e derivante