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mitia dedicar-se á arte, ao estudo, publicando as suas obras com sucesso e prestigio. O outro tinha familia, encargos, prisões burocraticas, embaraços, cuidados economicos que comprimem o espirito e restringem a produção.

Depois um retraía-se, evitava a exibição do seu genuino talento. O outro vivia cercado de condições prestigiosas. A arte d'este era uma caprichosa filigrana de estilo, um filtro capitoso de estetica, uma volupia espiritual que falava aos sentidos. A do outro era a harmonia sonora e maviosa do sentimento falando ao coração. E se um era um arco-iris, uma fosforescencia, um insecto alado de azas irisadas e frementes sugando o nectar das flores que o destino semeára no seu caminho desabrochando em gloria e proveito, o outro era uma claridade de aurora, era um grito de justiça e liberdade, era um sonho de poeta, era um poema de sentimento, deixando nas almas um rastro de perfume, de bondade e de beleza. Se um deslumbrava e embriagava, o outro aperfeiçoava, comovia e embelezava. E se um era gloria e brilho, o outro era gloria e luz, projectando clarões de altruismo.