não era minha; era de outro, daquelle que a perdera, rico ou pobre, e talvez fosse pobre, algum operario que não teria com que dar de comer á mulher e aos filhos; mas se fosse rico, o meu dever ficava o mesmo. Cumpria restituir a moeda, e o melhor meio, o unico meio, era fazel-o por intermedio de um annuncio ou da policia. Enviei uma carta ao chefe de policia, remettendo-lhe o achado, e rogando-lhe que, pelos meios a seu alcance, fizesse devolvel-o ás mãos do verdadeiro dono.
Mandei a carta e almocei tranquillo, posso até dizer que jubiloso. Minha consciencia valsára tanto na vespera, que chegou a ficar suffocada, sem respiração; mas a restituição da meia dobra foi uma janella que se abriu para o outro lado da moral; entrou uma onda de ar puro, e a pobre dama respirou á larga. Ventilae as consciencias! não vos digo mais nada. Todavia, despido de quaesquer outras circumstancias, o meu acto era bonito, porque exprimia um justo escrupulo, um sentimento de alma delicada. Era o que me dizia a minha dama interior, com um modo austero e meigo a um tempo; é o que ella me dizia, reclinada ao peitoril da janella aberta.
— Fizeste bem, Cubas; andaste perfeitamente. Este ar não é só puro, é balsamico, e uma transpiração dos eternos jardins. Queres ver o que fizeste, Cubas?
E a boa dama sacou um espelho e abriu-m’o deante dos olhos. Vi, claramente vista, a meia dobra da vespera, redonda, brilhante, nitida, multiplicando-se por si mesma, — ser dez — depois trinta — depois