a ambição, que um escrupulo desazára, e logo depois a duvida, e talvez o arrependimento, — mas um arrependimento, que viria outra vez, si se repetisse a hypothese, porque o fundo supersticioso existia. Duvidava da superstição, sem chegar a rejeital-a. Essa persistencia de um sentimento, que repugna ao mesmo individuo, era um phenomeno digno de alguma attenção. Mas eu preferia a pura ingenuidade de D. Placida, quando confessava não poder ver um sapato voltado para o ar.

— Que tem isso? perguntava-lhe eu.

— Faz mal, era a sua resposta.

Isto somente, esta unica resposta, que valia para ella o livro dos sete sellos. Faz mal. Disseram-lhe isso em criança, sem outra explicação; e ella contentava-se com a certeza do mal. Já não acontecia a mesma cousa quando se falava de apontar uma estrella com o dedo; ahi sabia perfeitamente que era caso de crear uma verruga.

Ou verruga ou outra cousa, que valia isso, para quem não perde uma presidencia de provincia? Tolera-se uma superstição gratuita ou barata; é insupportavel a que leva uma parte da vida. Este era o caso do Lobo Neves; com o accrescimo da duvida e do terror de haver sido ridiculo. E mais este outro accrescimo, que o ministro não acreditou nos motivos particulares; attribuiu a recusa do Lobo Neves a manejos politicos, illusão complicada de algumas apparencias; tratou-o mal, communicou a desconfiança aos collegas; sobrevieram incidentes; emfim, com o tempo, o presidente resignatario foi para a opposição.