De envolta com a transmissão e a educação, houve ainda o exemplo extranho, o meio domestico. Vimos os paes; vejamos os tios. Um delles, o João, era um homem de lingua solta, vida galante, conversa picaresca. Desde os onze annos entrou a admittir-me ás anecdotas, reaes ou não, eivadas todas de obscenidade ou immundicie. Não me respeitava a adolescencia, como não respeitava a batina do irmão; com a differença que este fugia logo que elle enveredava por assumpto escabroso. Eu não; deixava-me estar, sem entender nada, a principio, depois entendendo, e emfim achando-lhe graça. No fim de certo tempo, quem o procurava era eu; e elle gostava muito de mim, dava-me doces, levava-me a passeio. Em casa, quando lá ia passar alguns dias, não poucas vezes me aconteceu achal-o, no fundo da chacara, no lavadouro, a palestrar com as escravas que batiam roupa; e ahi é que era um desfiar de anecdotas, de ditos, de perguntas, e um estalar de risadas, que ninguem podia ouvir, porque o lavadouro ficava muito longe de casa. As pretas, com uma tanga no ventre, a arregaçar-lhes um palmo dos vestidos, umas dentro do tanque, outras fóra, inclinadas sobre as peças de roupa, a batel-as, a ensaboal-as, a torcel-as, iam ouvindo e redarguindo ás pilherias do tio João, e a commental-as de quando em quando com esta palavra:
— Cruz, diabo!... Este sinhô João é o diabo!
Bem differente era o tio conego. Esse tinha muita austeridade e pureza; taes dotes, comtudo, não realçavam um espirito superior, apenas compensavam um