companheiros pelo escândalo que dera, se bem que fosse certo não estar nenhum deles a tal respeito em circunstâncias de lhe atirar a primeira pedra, ouvindo um murmúrio surdo que se levantava ameaçando-o com a perda do lugar que exercia na Sé, decidiu-se a abandonar a cigana, e assim o fez. Com isto o Leonardo deu-se de todo por satisfeito, e renasceram-lhe as esperanças de conquistar o antigo posto, uma vez que o principal inimigo o tinha abandonado. A cigana, desprezada, não quereria sem dúvida ficar por muito tempo devoluta; e como ele se achava com requerimento em caixa, e contava serviços atrasados, era provável que obtivesse favorável despacho, porque também ela ainda nem sonhava que tudo o que tinha sucedido pudesse ter sido obra sua.
Começou pois o sentimental Leonardo a rondar a porta da sua antiga amante: se a via na janela, ora parava na esquina a dirigir-lhe olhares suplicantes; passando por junto dela deixava ora escapar um magoadíssimo suspiro ou uma queixa amargurada.
Todas estas cenas, desempenhadas por aquela figura do Leonardo, alto, corpulento, avermelhado, vestido de casaca, calção e chapéu armado, eram tão cômicas, que toda a vizinhança se divertiu com elas por alguns dias. Alguns imprudentes começaram, conversando das janelas, a atirar indiretas à cigana; esta picou-se com isso, e foi essa a fortuna do Leonardo. Um dia que ele passou deu-lhe ela de olho que entrasse.
O Leonardo teve uma sensação inexplicável; seu rosto coloriu-se em todos os tons, desde o vermelho, que era sua cor habitual, até o roxo enegrecido; depois baixou gradualmente até a palidez marmórea;