com os olhos um no outro, passaram rapidamente pelo pensamento do Leonardo os lances de sua vida de outrora, e remontando de fato em fato, chegou àquela ridícula mas ingênua cena da sua declaração de amor a Luisinha. Pareceu-lhe que tinha então escolhido mal a ocasião, e que agora isso teria um lugar muito mais acertado.

A comadre, que dava uma perspicaz atenção a tudo o que se passava, como que leu na alma do afilhado aqueles pensamentos todos; fez um gesto quase imperceptível de alegria: raiava-lhe na mente alguma idéia luminosa. Começou então a retraçar um antigo plano em cuja execução por muito tempo trabalhava, e cujas probabilidades de êxito lhe haviam reaparecido no que se acabava de passar.

Passada a primeira emoção, Luisinha ergueu-se e fez ao Leonardo um acanhado cumprimento: este correspondeu-lhe com alguma coisa entre cumprimento paisano e continência militar.

A comadre rompeu depois disto a conversa, procurando entreter D. Maria, e deixar os dois entregues a si.

— Diga-me, disse ela dirigindo-se a D. Maria, e aquela sua demanda com o defunto?

— A morte foi desta vez juiz. Ele não tem herdeiros; era só no mundo... Eu não levei a minha avante, é verdade, porque enfim não posso dizer que venci; mas também não perdi. Agora sim, tenho muito gosto de entregar tudo à menina, mas não queria que me levassem as coisas senão por minha muito livre vontade.

— Está bem; o passado já lá vai: Deus é assim, escreve direito por linhas tortas.