Onde começa o advogado ou o tribuno, acaba o poeta.

O fato é que não possuo a forma do verso, na qual a idéia se modela por si mesma e donde sai com o timbre próprio da verdadeira rima, que nenhum artifício nem esforço pode imitar. Isto, por um lado, quanto à pequena poesia, à poesia solta, ao que se pode chamar a música da poesia. Quanto à grande poesia, à poesia de imaginação e criação, poema, romance, balada que fosse, para essa eu seria incapaz, além da insuficiência do talento, pela falta de coragem para habitar a região solitária dos espíritos criadores, os quais vivem naturalmente entre figuras tiradas de si mesmos, sem vida própria, autômatos da sua inteligência e da sua vontade, como em um sonho acordado. Nessa altura, onde tudo é fictício, tudo irreal, tudo fantástico, a poesia tem para mim o terror do adytum da Pítia. Mesmo quando as figuras sejam meigas, suaves, humanas, a criação envolve sempre alguma coisa de misterioso e terrível; a completa abstração, que ela supõe, da realidade exterior, do mundo dos sentidos, me daria vertigem.

Há, além da poesia de sentimento e da poesia de criação, outra poesia. O verso é a mais nobre forma do pensamento, a mais pura cristalização da idéia, e, como se tem dito, o que não se pode expressar em verso não vale quase a pena ser conservado. Essa poesia, porém, que engasta as belas idéias