recado que vinha. O rapaz não adivinhava. Uma ou outra escapada n’aquellas edades, que muito era?... — E a alma do barão, um momento assombreada no receio da separação do ephebo, e que estas mansas ponderações tranquillisaram, ahi desatou a convulsivar novamente, com toda a rubra expansão da sua diathese, em vortilhões d’uma impetuosidade sórdida, em fúrias duma violência corrosiva e faminta.

No avermelhamento crepuscular que o petroleo do candieiro derramava em volta, côado pelo pára-luz de loiça branca, o atormentado vulto de D. Sebastião movia-se sinistro e longo como um espectro, — o olhar em brasa, dançantes os braços, a bocca monologando, e os dedos compridos e nodosos acolchetando o vacuo em ancias de naufrago, emaciados, tremulos.

— Não acabava de chegar o maldito! — E os passeios alongavam-se agora da sala, pelo corredor adeante, té ao extremo da casa de jantar, a qual já se não envergonhava da nudez d'outro tempo. Muito bem guarnecida. Tremeluziam na sombra facetamentos de crystaes, opalinidades de loiças, golpeaduras metallicas de luz; esboçavam-se formas d'uma mobilia elegante de nogueira, filetada a preto; phosphorejavam pelos vidros dos quadros e pelas portas do guarda-loiça espelhamcntos vagos. As paredes tinham sido forradas dum papel caro, em relêvo, como se não encontrava áquelle tempo em nenhuma outra casa de Lisbôa, a não ser, largo de S. Christovão, no escriptorio do barão; mandára-o vir expressamente; era de fabricação austríaca e imitava coiro lavrado.