sentando-se tranquilamente, rechupou o fundo do copo.

Então, com os cotovelos sobre a mesa, a garrafa entre eles, conversaram baixo, de rosto a rosto, sobre o plano do folheto. A coisa era fácil: escrevê-lo-iam ambos. João Eduardo queria-o em forma de romance, de enredo negro, dando ao personagem do pároco os vícios e as perversidades de Calígula e de Heliogábalo. O tipógrafo porém queria um livro filosófico, de estilo e de princípios, que demolisse de uma vez para sempre o Ultramontanismo! Ele mesmo se encarregava de imprimir a obra aos serões, grátis, já se sabe. - Mas apareceu-lhes então, bruscamente, uma dificuldade.

— O papel? Como se há-de arranjar o papel?

Era uma despesa de nove ou dez mil-réis; nenhum os tinha - nem um amigo que, por dedicação aos princípios, lhos adiantasse.

— Pede-os ao Nunes por conta do teu ordenado! lembrou vivamente o tipógrafo.

João Eduardo coçou desconsoladamente a cabeça. Estava justamente pensando no Nunes e na sua indignação de devoto, de membro da junta de paróquia, amigo do chantre, apenas lesse o panfleto! E se soubesse que era o seu escrevente que o compusera, com as penas do cartório, no papel almaço do cartório... Via-o já roxo de cólera, alçando sobre o bico dos sapatos brancos a sua pessoa gordalhufa, e gritando na voz de grilo - "Fora daqui, pedreiro-livre, fora daqui!"

— Ficava eu bem arranjado, disse João Eduardo muito sério, nem mulher, nem pão!

Isto fez lembrar também a Gustavo a cólera provável do doutor Godinho, dono da tipografia.