capa de Nossa Senhora, que havia dias chegara de presente duma devota rica de Ourém. Amélia admirou-a muito. Era de cetim azul, representando um firmamento, com estrelas bordadas, e um centro, de lavor rico, onde flamejava um coração de ouro cercado de rosas de ouro. Amaro desdobrara-a, fazendo cintilar junto da janela os bordados espessos.

— Rica obra, hem? centos de mil-réis... Experimentamo-la ontem na imagem... Vai-lhe como um brinco. Um bocadito comprida, talvez... - E olhando Amélia, numa comparação da sua alta estatura com a figura atarracada da imagem da Senhora: - A ti é que te havia de ficar bem. Deixa ver...

Ela recuou:

— Não, credo, que pecado!

— Tolice! disse ele adiantando-se com a capa aberta, mostrando o forro de cetim branco, duma alvura de nuvem matutina. Não esta benzida... É como se viesse da modista.

— Não, não, dizia ela frouxamente, com os olhos jà1uzidios de desejo. Ele então zangou-se. Queria talvez saber melhor do que ele o que era pecado, não? Vinha agora a menina ensinar-lhe o respeito que se deve aos vestuários dos santos?

— Ora não seja tola. Deixe ver.

Pôs-lha aos ombros, apertou-lhe sobre o peito o fecho de prata lavrada. E afastou-se para a contemplar toda envolvida no manto, assustada e imóvel, com um sorriso cálido de gozo devoto.

— Oh filhinha, que linda que ficas!

Ela então, movendo-se com uma cautela solene,