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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

Mas o que é propriedade?[1]

O dicionário Houaiss assim a define, entre outras definições aplicáveis[2]: (i) coisa possuída com exclusividade, (ii) pertença ou direito legal de possuir (algo), (iii) imóvel pertencente a alguém; prédio, casa, (iv) direito de usar, gozar e dispor de um bem, e de reavê-lo do poder de quem ilegalmente o possua.

Naturalmente, não se espera de um dicionário que traga definição jurídica precisa. Vê-se que os conceitos de posse (i e ii) e de propriedade imóvel (iii) encontram-se imbricados. Mas é o item (iv) que mais se destaca pela terminologia adotada.

O Código Civil brasileiro[3] (doravante, “CCB”) não define o que vem a ser propriedade. Apenas determina, em seu art. 1.228 que “[o] proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald criticam a decisão do legislador em omitir o conceito de propriedade[4]:

 
No Código Civil em vigor, o art. 1.228 reproduz a ideia mestra da propriedade.
Endossamos a crítica formulada por Luiz Roldão de Freitas no sentido de o Código Civil de 2002 – a exemplo do BGB – ter mais uma vez omitido o conceito de propriedade, pois, ao enumerar as faculdades essenciais que integram o domínio – uso, fruição e disposição da coisa –, a lei guiou-se menos por um viés científico do que por um singelo critério escritivo da propriedade, através de seus poderes. Isso conduz a soluções pouco exatas, pois aprisiona o direito de propriedade a um só tipo de propriedade.
 

A crítica final dos autores – aprisionar o direito de propriedade a um único tipo – é de fato pertinente. Não é possível tratarmos o instituto da propriedade a partir de uma perspectiva absoluta. Ao contrário: a propriedade é múltipla. Por conta disso, a definição de propriedade é, sem dúvida, tormentosa. Orlando Gomes afirma que “[o] direito real de propriedade é o mais amplo dos direitos reais, – ‘plena in re potesta’”[5]. A seguir, preceitua[6]:

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  1. Apesar de ser intuitivamente simples a compreensão da propriedade, sua explicação jurídica é bastante complexa.
    Podemos aqui parafrasear Cecília Meirelles, que disse a respeito da liberdade: “Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta / que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda”.
  2. HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa – 2ª Reimpressão. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.
  3. Lei 10.406/02.
  4. FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 167. Para uma análise estrutural e funcional do art. 1.228 do CCB, ver BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de e TEPEDINO, Gustavo (orgs.). Código Civil Interpretado Conforme a Constituição da República, Vol. III. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.
  5. Grifos no original. GOMES, Orlando. Direitos Reais – 10ª ed. Rio de Janeiro: ed. Forense, 1994; p. 85.
  6. Grifos no original. GOMES, Orlando. Direitos Reais – 10ª ed. Cit.; p. 85.