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Sérgio Branco

que for, deve ser prévia e expressamente autorizada – ainda que se trate de modalidade de autorização não explicitamente mencionada.

Ocorre que numa interpretação precipitada de qualquer dos incisos acima transcritos, poderia parecer que mesmo uma única fotocópia de uma página de livro ou ainda o uso de um pequeno trecho de música em outra obra estaria ferindo o disposto na lei. Para se evitar esse tipo de controle extremado, a LDA prevê em seu art. 46 as chamadas limitações aos direitos autorais, das quais cuidaremos mais à frente.

Qual a importância de se discutir a natureza jurídica dos direitos autorais? Como lembra Teresa Negreiros, “as classificações jurídicas, se, por um lado, pecam por tentar reduzir a categorias abstratas fenômenos complexos, por outro lado, têm a importante função de sistematizar o conhecimento jurídico e (...) podem inclusive apoiar importantes reformulações no tratamento dogmático dos institutos e na sua aplicabilidade concreta”[1]. No caso específico dos direitos autorais, Giselda Hironaka e Silmara Chinelato afirmam tratar-se a discussão sobre sua natureza jurídica algo de fundamental importância, “pois repercutirá em temas diversos em relação aos quais as polêmicas, dúvidas, indagações e perplexidades serão resolvidas à luz da tomada de posição quanto à natureza em tela”. Assim, por exemplo, “quanto à desapropriação de direito autoral”[2].

Afirma Gama Cerqueira[3]:


Segundo Piola Caselli, o êrro principal de Kohler, assim como de todos os que porfiam em considerar o direito de autor simplesmente como instituto de direito patrimonial, consiste na apreciação unilateral e inexata da natureza da obra intelectual. A obra do engenho, diz o autor, é, certamente, um bem e apresenta, como tal, uma “objetividade externa”. Mas êste bem é essencialmente diverso de qualquer outra espécie de bens, sob duplo aspecto. Em primeiro lugar, porque permanece sempre, senão compreendido na esfera da personalidade de seu autor ou criador, pelo menos ligado de modo constante a essa esfera da personalidade, que determina o nascimento e a extensão da relação jurídica, de que êsse bem constitui objeto. Em segundo lugar, êsse bem, ao contrário de todos os outros bens patrimoniais, é representativo da personalidade do autor nas relações sociais.

  1. NEGREIROS, Teresa. Teoria dos Contratos – Novos Paradigmas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002; pp. 341-342.
  2. CHINELATO, Silmara Juny de Abreu e HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Propriedade e posse: uma releitura dos ancestrais institutos. Reflexos no direito autoral. Revista de Direito Autoral – Ano I – Número I, agosto de 2004. Rio de Janeiro: Lumen Juris; p. 68. Acrescenta João Paulo Capella Nascimento: “há que se ponderar que, dependendo da natureza jurídica que se seja atribuída a qualquer direito, diferente será a interpretação e a aplicação da própria lei. Assim, se qualificarmos os direitos sobre os bens imateriais como direitos reais ou pessoais, a interpretação e aplicação da lei a eles relativa seguirá necessariamente, mesmo que de forma subsidiária, todo o regime jurídico relativo aos direitos reais ou pessoais. Ao revés, se qualificarmos a natureza jurídica desse direito como sendo, como apregoam alguns, um direito novo, imprescindível seria traçar-lhe um regime jurídico também novo, de forma a que tivesse ele uma perfeita integração no ordenamento jurídico como um todo”. NASCIMENTO, João Paulo Capella. A Natureza Jurídica do Direito sobre os Bens Imateriais. Revista da ABPI, n. 28; p. 23.
  3. Grifo no original. CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial – Vol. I. Cit.; p. 111.