Página:O Dominio Publico no Direito Autoral Brasileiro.pdf/64

Sérgio Branco

Conforme anteriormente mencionado, acreditamos que os direitos patrimoniais, que autorizam ao autor fazer uso econômico de sua obra, não podem ser classificados como direito de propriedade. Da mesma forma, apesar de a doutrina de modo geral assim tratá-los, entendemos que os direitos morais não podem ser qualificados como direitos de personalidade, mas tão-somente como direitos extrapatrimoniais, ou pessoais.

Alguns doutrinadores atribuem ao direito patrimonial de autor a natureza de direito real de propriedade[1]. No entanto, conforme várias vezes enfatizado, a questão não é pacífica – muito pelo contrário.

Em obra clássica, Antônio Chaves aponta 9 diferentes teorias para determinar a natureza jurídica do direito autoral para finalmente concluir que “[p]odendo embora constituir uma parte relevantíssima do patrimônio, não é uma verdadeira propriedade. Se não chega a ser, como entende Laurent, uma criação arbitrária da lei, o fato de acrescentar, sob certos aspectos, duração limitada, confirma tratar-se de um direito ‘sui generis’”[2] [3].

O autor ainda menciona as principais características do direito autoral a ponto de afastá-lo do direito de propriedade comum[4]:


A diferença essencial, que existe entre o direito de autor e o de propriedade material, revela-se tanto pelo modo de aquisição originário (único título: criação da obra), como pelos modos de aquisição derivados, lembrando Bluntschli que no direito autoral uma perfeita transferência não existe, não saindo completamente uma obra intelectual da esfera de influência da personalidade que a criou.

Distingue-se, ainda, quanto à duração, quanto à sua extensão, posse, comunhão, formas de extinção.

No que porém mais se distancia o direito autoral da propriedade material é na separação perfeitamente nítida que se estabelece no período anterior e posterior à publicação da obra, sendo absoluto, na primeira, e constituindo-se, na segunda, de faculdades relativas, limitadas e determinadas: patrimoniais exclusivas de publicação, reprodução etc., que recaem sobre algumas formas de aproveitamento econômico da obra, e de natureza pessoal, referentes à defesa da paternidade e da integridade intelectual da obra.

48
  1. Ver, entre outros, os já citados CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial – Vol. I. Cit.; p. 165 e BARBOSA, Cláudio R. Propriedade Intelectual'. Cit.
  2. São as seguintes as teorias mencionadas: (i) direito da coletividade; (ii) direito real de propriedade; (iii) emanação do direito de personalidade; (iv) direito especial de propriedade, tendo por objeto um valor imaterial; (v) direito sui generis; (vi) direito de clientela; (vii) direito dúplice de caráter real: pessoal-patrimonial; (viii) direito pessoal de crédito; (ix) direito privativo de aproveitamento. CHAVES, Antônio. Direito de Autor – Princípios Fundamentais. Cit.; pp. 9-16.
  3. Stéphanie Choisy critica a qualificação sui generis, aplicável ao que quer que seja, pois consistiria no “ressource suprême du juriste embarassé”. CHOISY, Stéphanie. Le Domaine Public en Droit d’Auteur. Cit.; p. 22. Tendemos a concordar com a autora. Se não há classe em que se ajuste, então novas classes devem ser buscadas. Conforme visto acima (v. Teresa Negreiros), há importância capital em se classificar adequadamente os institutos jurídicos.
  4. CHAVES, Antônio. Direito de Autor – Princípios Fundamentais. Cit.; p. 16.