incompatíveis uma com a outra; mas isso não se deu no Brasil. As duas raças misturaram-se e confundiram-se; as combinações mais variadas dos elementos de cada uma tiveram lugar, e a esses juntaram-se os de uma terceira, a dos aborígenes. Das três principais correntes de sangue que se confundiram nas nossas veias, o português, o africano e o indígena, a escravidão viciou sobretudo os dois primeiros. Temos aí um primeiro efeito sobre a população: o cruzamento dos caracteres da raça negra com os da branca, tais como se apresentam na escravidão a mistura da degradação servil de uma com a imperiosidade brutal da outra.

No princípio da nossa colonização, Portugal descarregava no nosso território os seus criminosos, as suas mulheres erradas,[1] as suas fezes sociais todas, no meio das quais excepcionalmente vinham emigrantes de outra posição, e por felicidade grande número de judeus. O Brasil se apresentava então como até ontem o Congo. No século XVI ou XVII, o espírito de emigração não estava bastante desenvolvido em Portugal para mover o povo, como desde o fim do século passado até hoje, a procurar na América portuguesa o bem-estar e a fortuna que não achava na Península. Os poucos portugueses que se arriscavam a atravessar o oceano à vela e a

  1. Padre Manuel da Nóbrega. No seu romance abolicionista Os herdeiros de Caramuru, o Dr. Jaguaribe Filho, um dos mais convictos propugnadores da nossa causa, transcreve a carta daquele célebre jesuíta, de 9 de agosto de 1549, em que se vê como foi fabricada pela escravidão a primitiva célula nacional.