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ambos. O sitio, a hora, tudo concorria para dar á impressão uma intensidade que ia ao fundo do coração, á medula dos ossos.

— Estou me lembrando de tudo, proseguiu o bandido. Eu estava sentado, com o clavinote atravessado nas pernas debaixo daquelle pé de pau. Ouvi as pizadas de um cavalo, e o estrallar de garranchos e cipós que se quebravam. Metti-me um pouco mais para dentro, a fim de ver, sem ser visto, quem é que vinha. Eu estava com fome, e não tinha dinheiro nenhum. «Si fosse um homem que trouxesse dinheiro — pensei eu — estava muito bem»!! Neste momento o cavalleiro passou por diante de mim. Trazia chapeu novo, um gibão de panno-fino azul, botas lustrosas e esporas de prata; montava um cavallo russo-pombo, gordo e passeiro. Conheci logo que era um marchante. Levei o bacamarte ao rosto, e quando o cavalleiro quebrou alli à direita para tomar o vau do rio, fiz-lhe fogo na cabeça. Corri com a minha faca na mão ao lugar onde elle havia cahido. Estava morto; a balla tinha-lhe entrado ao pé da orelha direita e sahido acima do olho esquerdo. Ambos os olhos estavam da banda de fóra, o cabello e a barba nadavam em sangue. Tirei-lhe um maço de patacões que trazia em um dos bolços do gibão, o punhal apparelhado de prata, os