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MONTEIRO LOBATO

— Boa Jane, disse elle, é a hora de separar-nos. Tenho confiança em ti e espero que, passado o rude momento, te conformes com a situação, buscando conforto no stoicismo que te ensinei e de que te dei exemplo em vida. Ha já algum tempo que me sentia mal. Occultava-o a ti para evitar-te um soffrimento inutil. Mas esta noite percebi que chegara o fim. Quando te deixei no gabinete, com pretexto de concluir um trabalho, illudi-te, ou, melhor, vim fazer um trabalho muito diverso do que poderias suppor. Vim destruir a minha descoberta. Queimei toda a papelada relativa e desmontei as peças mestras dos apparelhos. O que resta nenhuma significação possue e não poderá ser restaurado. Desfiz em meia hora todo o trabalho de uma vida. Da minha invenção restam apenas as impressões que te deixou ella na memoria. E quando por tua vez morreres, tudo se extinguirá...

— Meu pae ! exclamou Jane, achegando o seu rosto afogueado á face descorada do velho.

— Teu pae, teu amigo, teu companheiro de trabalho...

Não pude conter-me deante do doloroso quadro, e grossas lagrimas borbotaram-me dos olhos. O moribundo não esqueceu o hospede. Volveu com esforço um olhar para o meu lado e disse, em voz cada vez mais fraca :