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O PRECURSOR DO ABOLICIONISMO NO BRASIL
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daquele preto que, escravo e analfabeto integral, em 1847, quando Prado Junior lhe ensinou as primeiras letras, surgia, inopinadamente, poeta, com livro publicado e bem recebido pela crítica indígena, doze anos depois. O sucesso era realmente fóra do comum e devia ter chocado o ambiente de maneira vivíssima. Por mais que o quizessem negar, o livro constituia um veemente libelo da raça desprezada, que demonstrava, assim, a sua capacidade de ascensão.

E o protesto não vinha com o tom declamatorio das tiradas retóricas contra a opressão e contra a violencia. Era um protesto risonho, referto daquele riso escarninho e vingativo que é o traço fundamental das sátiras.

Porque suas composições poéticas, se não têm nada de extraordinario como beleza exterior, se não denunciam nele um privilegiado das Musas e um eleito da Arte, punham de manifesto um observador arguto e um vivacíssimo crítico de costumes. Excedeu-se Alberto Faria. o de Campinas [1], quando classificou o livro “mero arremedo formal de estrofes exóticas, sobre costumes e defeitos da época”. E ainda, quando julgou “quasi de todo serodia” a 3.ª edição póstuma.

Se ha muita cousa que envelheceu, como não podia deixar de acontecer num livro em que inumeras composições nasceram do comentário fortúito e ocasional de fatos que se foram sucedendo, no pequeno âmbito da cidade provinciana, a obra possue, contudo, muita cousa

  1. Conferencia no Instituto Historico Nacional, publicado no «Estado de São Paulo» a 13 de maio de 1924.