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o sertanejo

nas ficou por algum tempo a lampada da casa de jantar, que era costume deixar até de todo concluir-se a tarefa diaria.

     Em quanto bruxoleou ao longe, no seio das trevas, a luz solitaria, Arnaldo esteve embevecido á contempla-la, como si a tremula irradiação lhe desenhasse formoso painel.

     Era assim todas as noites em que malhava ali, na sua pousada, quando as correrias da vida erratica do sertanejo não o levavam pelo mundo sem destino.

     Essa luminaria, elle a amava como sua estrella. As almas que vivem no campo, ao relento, sob um firmamento cravejado das mais brilhantes constellações, todas tem um astro de sua particular devoção, um amigo no céo, com quem se entretem e conversam nos serões das noites ermas.

     Para Arnaldo todas essas meigas virgens do céo lhe eram irmãns ; conhecia-as pela scintilação, como se conhece pelos olhos a menina faceira que se embuçou na sua mantilha azul. A' cada uma saudava pelo nome, não o que inventaram os sabios, e sim o que lhe dera sua fantasia de filho do deserto.