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Aquella formosura celebrando
Com que Amor cego a tanta vista engana:
Mais hia a d’alma sua publicando,
Porqu’era mais divina do que humana:
Ja d’huma, e d’outra ja dizia tanto,
Qu’em huns criava amor, n’outros espanto.

Ouvidos seus louvores, muitas vezes
Desejou desta virgem fazer nora
Hum Rei que o sceptro tinha dos Inglezes,
Idolatras então, cegos agora.
Ó povo cego e leve! as torpes fezes
Aparta do ouro puro e lança fóra,
Torna-te ao teu pastor, perdido gado!
Ólha que vás sem elle mal guiado.

Hum filho deste Rei (de quem dizia
Que ser de Ursula sogro desejava)
Movido do rumor que della ouvia,
Ja dentro no seu peito a namorava.
Alli seu amor, delle, lhe offrecia;
Alli por o amor della suspirava.
Suspira elle por ella; ella suspira
Tambem por outro amor que nunca vira.

Mandou o Rei Inglez Embaixadores
Com pompa Regia e lustre sumptuoso,
(Do grande Reino seu grandes Senhores)
A Noto, Rei não tanto poderoso.
Pedio-lhe a bella filha (qu’em amores
Ardia toda do celeste Esposo)
Para esposa do filho, que sabia
Que ja d’amores della todo ardia.

O Rei Bretão se achava descontente