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SONETOS.
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CLVI.

Se algum'hora essa vista mais suave
Acaso a mi volveis, em hum momento
Me sinto com hum tal contentamento,
Que não temo que damno algum me aggrave.

Mas quando com desdem esquivo e grave
O bello rosto me mostrais isento,
Huma dor provo tal, hum tal tormento,
Que muito vem a ser que não me acabe.

Assi está minha vida, ou minha morte
No volver de esses olhos; pois podeis
Dar co'huma volta delles morte, ou vida.

Ditoso eu, se o Ceo quer, ou minha sorte,
Que ou vida, para dar-vo-la, me deis,
Ou morte, para haver morte querida!



CLVII.

Tanto se forão, Nympha, costumando
Meus olhos a chorar tua dureza,
Que vão passando ja por natureza
O que por accidente hião passando.

No que ao somno se deve estou velando,
E venho a velar só minha tristeza:
O chôro não abranda esta aspereza,
E meus olhos estão sempre chorando.

Assi de dor em dor, de mágoa em mágoa,
Consumindo-se vão inutilmente,
E esta vida tambem vão consumindo.

Sôbre o fogo de amor inutil ágoa!
Pois eu em chôro estou continuamente,
E do que vou chorando te vás rindo.

Assi nova corrente
Levas de chôro em foro;
Porque de ver-te rir, de novo chóro.