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CCLXVI.
Sempre, cruel Senhora, receei,
Medindo vossa grã desconfiança,
Que désse em desamor vossa tardança,
E que me perdesse eu, pois vos amei.
  Perca-se, em fim, ja tudo o qu'esperei,
Pois n'outro amor ja tendes esperança.
Tão patente será vossa mudança,
Quanto eu encobri sempre o que vos dei.
  Dei-vos a alma, a vida e o sentido;
De tudo o qu'em mi ha vos fiz senhora.
Prometteis, e negais o mesmo Amor.
  Agora tal estou, que de perdido,
Não sei por onde vou, mas algum'hora
Vos dará tal lembrança grande dor.
CCLXVII.
Se a fortuna inquieta e mal olhada,
Que a justa lei do Ceo comsigo infama,
A vida quieta, qu'ella mais dasama,
Me concedêra honesta e repousada;
  Pudéra ser que a Musa, alevantada
Com luz de mais ardente e viva flama,
Fizera ao Tejo lá na patria cama
Adormecer co'o som da lyra amada.
  Porém, pois o destino trabalhoso,
Que m'escurece a Musa fraca e lassa,
Louvor de tanto preço não sustenta;
  A vossa, de louvar-me pouco escassa,
Outro sogeito busque valeroso,
Tal qual em vós ao mundo se apr