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PREFAÇÃO.
XXIII

Nasceo no pégo a deosa, qu'he senhora
Do amoroso prazer, que sempre tarda.
Se foi bezerro o deos que cá se adora,
Tambem ja foi delphim. Se se resguarda,
Vê-se que os moços pescadores erão,
Que o escuro enigma ao primo vate derão.

Agora passa o vaqueiro a queixar-se da frieza com que a sua pastora recebe as suas finezas.

Agrario.


  Formosa Dinamene, se dos ninhos
Os implumes penhores ja furtei
Á doce philomela, e dos murtinhos
Para ti (fera!) as flores apanhei;
E se os crespos madronhos nos raminhos
Com tanto gosto ja te presentei,
Porque não dás a Agrario desditoso
Um só revolver d'olhos piedoso?

Responde-lhe o seu adversario com uma Estancia do mesmo genero, segundo os preceitos do canto amebeo, ou alternado.

Alicuto.


  Para quem trago d'ágoa em vaso cavo
Os curvos camarões vivos saltando?
Para quem as conchinhas ruivas cavo
Na praia, os brancos buzios apanhando?
Para quem de mergulho no mar bravo
Os ramos de coral vou arrancando,
Senão para a formosa Lemnoria,
Que co'um só riso a vida me daria?