Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/391

317}
Puzestes-me em poder
De falsas esperanças:
E do que mais m'espanto,
Que nunca vali tanto,
Que visse tanto bem, como esquivanças.
Valia tão pequena
Não póde merecer tão doce pena.
  Houve-se Amor comigo
Tão brando, ou pouco irado,
Quanto agora em meus males se conhece.
Que não ha mor castigo
Para quem tẽe errado,
Que negar-lhe o castigo que merece.
Da sórte que acontece
Ao misero doente,
Da cura despedido,
Que o Medico advertido
Tudo quanto deseja lhe consente;
O Amor me consentia
Esperanças, desejos e ousadia.
  E agora venho a dar
Conta do bem passado
A esta triste vida e longa ausencia.
Quem póde imaginar
Qu'houvesse em mi peccado
Digno d'huma tão grave penitencia?
Olhae que he consciencia
Por tão pequeno êrro,
Senhora, tanta pena.
Não vêdes que he onzena?
Mas se tão longo e misero destêrro{318}