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como dissemos, e com rogos e promessas o persuadio a que fosse com elle para Çofala. Mas de tal maneira cumprio o promettido, que o poeta chegando a Moçambique, assentou resgatar-se daquelle captiveiro; e andava procurando meios de se transportar ao Reino, quando, mui a proposito para o seu intento, alli aportou a nao Santa Fe, em que vinhão alguns amigos seus, como Heitor da Silveira e o Chronista Diogo do Couto e outros, que pela honra de trazerem na sua companhia tão grande homem, lhe offerecêrão passagem franca para Lisboa. Mas Pedro Barreto, como lhe chegasse isto aos ouvidos, a exemplo do Fios Seccos, o mandou prender por duzentos cruzados, que na India lhe dera para sua matalotagem, e agora lhe pedia como divida: do que indignados aquelles generosos amigos se fintárão entre si, e satisfazendo a somma exigida, resgastárão o poeta. Assim que (observa Faria e Sousa) a pessoa de Luis de Camões e a honra de Pedro Barreto por duzentos cruzados foi vendida.
  Nesta viagem vinha elle escrevendo muito n'um livro entitulado Parnaso de Luis de Camões, que trazia ja mui adiantado: do qual diz Diogo do Couto, a quem o poeta o mostrou, que era obra de inestimavel preço, cheia de erudição e philosophia.
  No anno de 1569 chegou emfim a Lisboa, onde então ardia o contagio, que chamárão a grande peste. E não obstante este flagello do Ceo, que tinha todos os animos occupados de terror, tal foi o seu contentamento em ver-se restituido á patria, que escrevendo a um seu amigo do Porto, lhe dizia que ainda não{LIII}