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SONETOS.


X.

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar:
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nella está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente póde descansar,
Pois com elle tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semidea,
Que como o accidente em seu sojeito,
Assi com a alma minha se confórma;

Está no pensamento como idea;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a materia simples busca a fórma.



XI.

Passo por meus trabalhos tão isento
De sentimento grande nem pequeno,
Que só por a vontade com que peno
Me fica Amor devendo mais tormento.

Mas vai-me Amor matando tanto a tento,
Temperando a triaga co'o veneno,
Que do penar a ordem desordeno,
Porque não mo consente o soffrimento.

Porém se esta fineza o Amor sente
E pagar-me meu mal com mal pretende,
Torna-me com prazer como ao sol neve.

Mas se me vê co'os males tão contente,
Faz-se avaro da pena, porque entende
Que quanto mais me paga, mais me deve.