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SONETOS.
XLII.

Lindo e subtil trançado, que ficaste
Em penhor do remedio que mereço,
Se só comtigo, vendo-te, endoudeço,
Que fôra co'os cabellos que apertaste?

Aquellas tranças de ouro que ligaste,
Que os raios do sol tẽe em pouco preço,
Não sei se ou para engano do que peço,
Ou para me matar as desataste.

Lindo trançado, em minhas mãos te vejo,
E por satisfação de minhas dores,
Como quem não tẽe outra, hei de tomar-te.

E se não for contente o meu desejo,
Dir-lhe-hei que nesta regra dos amores
Por o todo tambem se toma a parte.



XLIII.

O cysne quando sente ser chegada
A hora que põe termo á sua vida,
Harmonia maior, com voz sentida,
Levanta por a praia inhabitada.

Deseja lograr vida prolongada,
E della está chorando a despedida:
Com grande saudade da partida,
Celebra o triste fim desta jornada.

Assi, Senhora minha, quando eu via
O triste fim que davão meus amores,
Estando posto ja no extremo fio;

Com mais suave accento de harmonia
Descantei por os vossos desfavores
La vuestra falsa fe, y el amor mio.