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ORIGEM DAS ESPÉCIES

tadas à Madeira e às Canárias. As Bermudas e a Madeira foram, pois, povoadas pelos continentes próximos com aves que, durante longos séculos, lutaram já umas com as outras nas pátrias respectivas, e que se foram mutuamente adaptando entre si. Estabelecida uma vez no seu novo habitat, cada espécie devia ter sido mantida pelas outras nos seus limites próprios e nos seus antigos hábitos, sem apresentar muita tendência a modificações, porque o cruzamento com as formas não modificadas, que vinham de tempos a tempos da mãe-pátria, devia contribuir em extremo para a reprimir. A Madeira é, além disso, habitada por um número considerável de conchas terrestres que lhe são próprias, enquanto que nem uma só espécie de conchas marinhas é particular às suas costas; ora, posto que não conheçamos o modo de dispersão das conchas marinhas, é, contudo, fácil compreender que os seus ovos ou as suas larvas aderindo talvez a plantas marinhas ou a madeiras flutuantes, ou ainda às patas das pernaltas, pudessem ser transportadas bem mais fàcilmente do que conchas terrestres, através de 400 ou 500 quilómetros de pleno mar. As diversas ordens de insectos habitando a Madeira apresentam casos quase análogos.

As ilhas oceânicas são algumas vezes desprovidas de certas classes inteiras de animais de que o lugar é ocupado por outras classes; assim, os répteis nas ilhas Galápagos, e as aves ápteras gigantescas na Nova Zelândia, tomam o lugar dos mamíferos. É talvez duvidoso que se deva considerar a Nova Zelândia como ilha oceânica, por ser muito grande e ser separada da Austrália por um mar pouco profundo; o reverendo W. B. Clarke, fun- dando-se nos caracteres geológicos desta ilha e na direcção das cadeias de montanhas, sustentou recentemente a opinião de que devia, bem como a Nova Caledónia, ser considerada como uma dependência da Austrália. Quanto às plantas, o Dr. Hooker demonstrou que, nas ilhas Galápagos, os números proporcionais das diversas ordens são muito diferentes do que foram. Explicam-se geralmente todas estas diferenças em número, e ausência de grupos inteiros de plantas e de animais nas ilhas, pelas supostas diferenças nas condições físicas; mas a explicação parece-me pouco satisfatória, e creio que as facilidades de emigração devem ter gozado um papel pelo menos tão importante como a natureza das condições físicas.

Poderiam apresentar-se muitos factos notáveis relativos aos habitantes das ilhas oceânicas. Por exemplo, em algumas ilhas onde não há um só mamífero, certas plantas indígenas têm magníficas sementes com ganchos; ora, há poucas relações mais evidentes que a adaptação das sementes com ganchos ao trans-