OS MAIAS
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até o ultimo ceitil; os cheques voam, voam, como folhas seccas; e até aqui o costume da casa foi pôr de lado, fazer bolo, fazer reserva. Agora o dinheiro derrete-se...

Eusebio rosnou algumas palavras sobre os trens de Carlos, os nove cavallos, o cocheiro inglez, os grooms... O procurador acudiu:

— ­Isso, amigo, é de razão. Uma gente d’estas deve ter a sua representação, as suas cousas bem montadas. Ha deveres na sociedade... É como o sr. Affonso... Gasta muito, sim, come dinheiro. Não é com elle, que lhe conheço aquelle casaco ha vinte annos... Mas são esmolas, são pensões, são emprestimos que nunca mais vê...

— ­Desperdicios...

— ­Não lh’o censuro... É o costume da casa; nunca da porta dos Maias, já meu pae dizia, sahiu ninguem descontente... Mas uma frisa, de que ninguem usa! só para o Cruges, só para o Taveira!...

Teve de se callar. Justamente ao fundo do corredor assomava o Taveira, abafado até aos olhos na gola d’uma ulster, d’onde sahiam as pontas d’um cachenez de seda clara. O escudeiro desembaraçou-o dos agasalhos; e elle, de casaca e collete branco, limpando o bonito bigode humido da geada, veiu apertar a mão ao caro Villaça, ao amigo Eusebio, arrepiado, mas achando o frio elegante, desejando a neve e o seu chic...

— ­Nada, nada, dizia Villaça todo amavel, cá o nosso solzinho portuguez sempre é melhor...