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OS MAIAS

da innocencia, ou á vigilia da devassidão, aqui lhe ordeno que me tenha amanhã para meu lunch duas formosas perdizes.

E subitamente, n’uma outra voz, com um olhar que ella devia perceber:

— ­Duas perdizesinhas bem assadas e bem córadinhas. Frias, está claro... O costume.

Travou do braço de Carlos, voltaram á sala.

— ­Com franqueza, Carlos, que te parece a «Villa Balzac»?

Carlos respondeu como a respeito do episodio da Hebrea:

— ­Está ardente.

Mas elogiou o aceio, a vista da casa e a frescura dos cretones. De resto, para um rapaz, para uma cella de trabalho...

— ­Eu, dizia o Ega, passeiando pela sala, com as mãos enterradas nos bolsos do seu prodigioso robe de chambre, eu não tolero o bibelot, o bric-à-brac, a cadeira archeologica, essas mobilias d’arte... Que diabo, o movel deve estar em harmonia com a idéa e o sentir do homem que o usa! Eu não penso, nem sinto como um cavalleiro do seculo XVI, para que me hei de cercar de cousas do seculo XVI? Não ha nada que me faça tanta melancolia, como ver n’uma sala um veneravel contador do tempo de Francisco I recebendo pela face conversas sobre eleições e altas de fundos. Faz-me o effeito d’um bello heroe de armadura d’aço, viseira cahida e crenças profundas no peito, sentado a uma mesa de voltarete a jogar copas.