OS MAIAS
303

E ainda elle mascava as ultimas palavras, quando Concha, que digeria de perna estendida, se endireitou bruscamente como se fosse saltar, atirou um murro á borda da meza, e com os olhos chammejantes, desafiou o Eusebio a que repetisse aquillo! Queria que elle repetisse! Queria que dissesse se tinha vergonha d’ella, e de dizer que a tinha trazido a Cintra!... E como o Eusebio, já enfiado, tentava gracejar, fazer-lhe uma festa — ­ella despropositou, atirou-lhe os peiores nomes, dando sempre punhadas na meza, com uma furia que lhe torcia a bocca, lhe punha duas manchas de sangue no carão trigueiro. A Lolita, vexada, puchava-lhe pelo braço: a outra deu-lhe um repellão; e, mais excitada com a estridencia da propria voz, esvasiou-se de toda a bilis, chamou-lhe porco, accusou-o de forreta, usou-o como um trapo vil.

Palma afflicto, debruçado sobre a meza, exclamava n’um tom ancioso:

— ­Ó Concha, escuta lá!... Ouve lá!... Concha, eu te explico...

De repente, ella ergueu-se, a cadeira tombou para o lado: e o mulherão abalou pela sala fóra, a grande cauda de setim varreu desabridamente o soalho, ouviu-se dentro estalar uma porta. No chão ficara cahido um pedaço da mantilha de renda.

O creado que entrava do outro lado com a cafeteira estacou, afiando o olho curioso, farejando o escandalo; depois, calado e seccamente, foi servindo em roda o café.

Durante um momento houve um silencio. Apenas