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OS MAIAS

Algum tempo o break rodou em silencio, na belleza da noite. A espaços, a estrada apparecia banhada d’uma claridade quente que faiscava. Fachadas de casas, caladas e pallidas, surgiam, d’entre as arvores com um ar de melancolia romantica. Murmurios de agoas perdiam-se na sombra; e, junto dos muros enramados, o ar estava cheio d’aroma. Alencar accendera o cachimbo, e olhava a lua.

Mas, quando passaram as casas de S. Pedro, e entraram na estrada, silenciosa e triste, Cruges mexeu-se, tossiu, olhou tambem para a lua, e murmurou d’entre os seus agasalhos:

— ­Oh Alencar, recita para ahi alguma cousa...

O poeta condescendeu logo — ­apesar de um dos criados ir ali ao lado d’elles, dentro do break. Mas, que havia elle de recitar, sob o encanto da noite clara? Todo o verso parece frouxo, escutado diante da lua! Emfim, ía dizer-lhe uma historia bem verdadeira e bem triste... Veiu sentar-se ao pé do Cruges, dentro do seu grande capotão, esvaziou os restos do cachimbo, e, depois de acariciar algum tempo os bigodes, começou, n’um tom familiar e simples:

Era o jardim d’uma vivenda antiga,
Sem arrebiques d’arte ou flôres de luxo;
Ruas singellas d’alfazema e buxo,
Cravos, roseiras...

— ­Com mil raios! exclamou de repente o Cruges, saltando de dentro da manta, com um berro que