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OS MAIAS

— ­Porque?...

Ora porque! Por tudo. Pelo perigo, pelos desconfortos, pelo ridiculo... Emfim, a ella como mulher ficava-lhe bem ter phantasias pittorescas de romance; mas a elle competia-lhe ter bom senso.

Ella mordia o beiço, com todo o sangue na face. E não via alli bom senso. Via só frieza. Quando ella arriscava tanto, elle podia bem, por uma noite, affrontar os desconfortos da estalagem...

— ­Mas não é isso!...

Então que era? Tinha medo? Não havia mais perigo do que nas idas a casa da titi. Ninguem a podia conhecer, com outra côr de cabello, toda a sorte de véos, disfarçada n’um grande water-proof. Chegavam de noite, entravam para o quarto, d’onde não sahiam mais, servidos apenas pela escosseza. No dia seguinte, no comboio da noite, ella seguia para o Porto, tudo acabava... E n’aquella insistencia ella era o homem, o seductor, com a sua vehemencia de paixão activa, tentando-o, soprando-lhe o desejo; emquanto elle parecia a mulher, hesitante e assustada. E Carlos sentia isto. A sua resistencia a uma noite de amor, prolongando-se assim, ameaçava ser grotesca: ao mesmo tempo o calor de voluptuosidade que emanava d’aquelle seio, arfando junto d’elle e por elle, ia-o amollecendo lentamente. Terminou por a olhar de certo modo; e, como se o desejo se lhe accendesse emfim de repente á curta chamma que faiscava nas pupillas d’ella, negras, humidas, avidas, promettendo mil cousas, disse, um pouco pallido: