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OS MAIAS

olhas para mim? Um instante só, não voltes o rosto, tem pena de mim...

Não! elle não queria olhar. Temia aquellas lagrimas, o rosto cheio d’agonia. Ao calor do seio que arquejava sobre os seus joelhos, já tudo n’elle começava a oscillar, orgulhos, despeitos, dignidade, ciume... E então, sem saber, a seu pezar, as suas mãos apertaram as d’ella. Ella cobriu-lhe logo de beijos os dedos, as mangas, arrebatadamente: e anciosa implorava do fundo da sua miseria um instante de misericordia.

— Oh, dize que me perdôas! Tu és tão bom! Uma palavra só... Dize só que não me odeias, e depois deixo-te ir... Mas dize primeiro... Olha ao menos para mim como d’antes, uma só vez!...

E eram agora os seus labios que procuravam os d’elle. Então a fraqueza em que sentia afundar-se todo o seu sêr encheu Carlos de cólera, contra si e contra ella. Sacudiu-a brutalmente, gritou:

— Mas porque não me disseste, porque não me disseste? Para que foi essa longa mentira? Eu tinha-te amado do mesmo modo! Para que mentiste, tu?

Largára-a, prostrada no chão. E de pé, deixava cahir sobre ella a sua queixa desesperada:

— É a tua mentira que nos separa, a tua horrivel mentira, a tua mentira sómente!

Ella ergueu-se pouco a pouco, mal se sustendo, e com uma pallidez de desmaio.

— Mas eu queria dizer-t’o, murmurou muito