OS MAIAS
423

se apeou á porta particular dos quartos de Carlos, com a roupa suja n’uma trouxa.

Justamente Baptista atravessava o patamar com camelias n’um açafate.

— O Villaça já veio? perguntou-lhe Ega baixo, andando em pontas de pés.

— O snr. Villaça já lá está dentro ha bocado. V. exc.ª recebeu a roupa branca?... Eu tambem mandei um fato, porque n’esses casos sempre dá mais frescura...

— Obrigado, Baptista, obrigado!

E Ega pensava: — «Bem, Carlos já sabe tudo, o barranco está passado!» Mas demorou-se ainda, tirando as luvas e o paletot com uma lentidão cobarde. Por fim, sentindo bater alto o coração, puxou o reposteiro de velludo. Na ante-camara pesava um silencio; a chuva grossa fustigava a porta envidraçada, por onde se viam as arvores do jardim esfumadas na nevoa. Ega levantou o outro reposteiro que tinha bordadas as armas dos Maias.

— Ah! és tu? exclamou Carlos, erguendo-se da mesa de trabalho com uns papeis na mão.

Parecia ter conservado um animo viril e firme: apenas os olhos lhe rebrilhavam, com um fulgor sêcco, anciosos e mais largos na pallidez que o cobria. Villaça, sentado defronte, passava vagarosamente pela testa, n’um movimento cansado, o lenço de sêda da India. Sobre a mesa alastravam-se os papeis da Monforte.