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Monteiro Lobato

A sala de espera toava com o resto da fazenda. Paredes lagarteadas de rachas, escorridas de goteiras, com vestigios vagos de papel de fòrrar. Moveis, alguns, desapparelhados — duas cadeiras Luiz XV, de pallhinha rota, e centro do mesmo estylo com o marmore enegrecido pelo guano dos morcegos. No tecto, taboas despregadas, entremostrando rombos escuros.

Lugubre, lugubre...

— Tio Bento, disse eu procurando illudir com palavras a tristeza do coração, isto aqui ha de ser a sala nobre do sabbá das bruxas. Que não venham hoje atropelar-nos nem appareça a alma do capitão-mór a nos enfernizar o somno. Não é verdade que a alma do capitão-mór vagueia por ahi a deshoras ?

— Dizem, respondeu o preto. Dizem que apparece allı na casa do tronco, não ás dez mas à meia noite e sangra as unhas a arranhar as paredes...

— E depois vem cá arrastar correntes pelos corredores, hein ? Como é pobre a imaginativa popular ! Sempre e em toda a parte a mesma aria das correntes arrastadas ! Mas vamos ao que serve. Não haverá um quarto melhor que isto nesta hospedaria de mestre Tinhoso?

— Haver, ha — trocadilhou o preto, mas é o quarto do capitão-mór... Tem coragem?

— Inda não estás convencido, Bento, de que sou um poço de coragem ?

Poço tem fundo... retrucou elle, sorrindo philosophicamente. O quarto é aqui à direita.