Porque escutar o transito das horas?
Alguma dellas trar-me-ha conforto?
Não! Esses golpes, que no bronze ferem,
São para mim como dobrar por morto.

«Morto! morto! — me clama a consciencia:
Diz-m’o este respirar rouco e profundo.
Ai! porque fremes, coração de fogo,
Dentro de um seio corrompido e immundo?

Beber um ar diaphano e suave,
Que renovou da tarde o brando vento,
E converte-lo, no aspirar contínuo,
Em bafo apodrecido e peçonhento!

Estender para o amigo a mão mirrada,
E elle negar a mão ao pobre amigo;
Querer uni-lo ao seio descarnado,
E elle fugir, temendo o seu perigo!

E ver após um dia ainda cem dias,
Nús d’esperança, ferteis de amargura;
Soccorrer-me ao porvir, e acha-lo um ermo,
E só, bem lá no extremo, a sepultura!