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conta pertencem os chefes de Missão que, ao fallarem dos empregados da Embaixada ou Legação, costumam dizer: «meu Secretario,» «meu Addido.» São porém prudentes. E raro ouvil-os dar prova d'essa sua fatuidade na presença dos interessados. Até onde alcançam as nossas observações, tão nescia tendencia é geralmente um privilegio caracteristico d'aquelles que devem mais à fortuna do que á educação.

Os homens de verdadeiro merecimento desprezam semelhantes artificios, digamos boamente, imposturas; nem aspiram aos foros do charlatão. Aquell'outros pelo contrario parecem persuadidos de que, em logar de se tornarem ridiculos ou aborrecidos, vão conformes com o exemplo do primeiro Conde-duque de Olivarez, que, segundo se conta, nunca o viram com o riso na bocca, e cuja impassibilidade e presença de espirito estavam á prova dos maiores abalos; a tal ponto que, para anuunciar ao Rei seu amo a revolução de Portugal, disse-lhe que o Duque de Bragança tinha perdido a cabeça, e que a sua loucura proporcionava a Sua Magestade uma confiscação de bens na importancia de doze milhões. Coitados, não percebem a differença que vai de um rei nato a um rei de comedia!

Os que afecctam um espirito requintado têem a preencher papel mais difficil do que aquelles que se fiam só do gesto e pertencem ao genero «poseur»; e quando por ventura se não revelem desde logo, por terem talvez alguma habilidade, é de presumir que d’ali sempre tirem certo proveito. É possivel. Só diremos que poucos parecem ter essa habilidade. Não a tinha, em todo o caso, certo diplomata, outr'ora conhecido nosso, o qual, tendo-se por um Duque de Roquelaure ou por um Marquez de Bievre, raro abria a bocca sem que desse sahida a um equívoco ou jogo de palavras; pois que infelizmente para elle eram demasiadas vezes da força d'aquelle attribuido aos ebrios na «Gargantua», de Ra-