a libertinagem do espírito, não a das ações. Fazia o seu epigrama contra as reputações duvidosas, mas não era capaz de perder nenhuma. E, todavia, teria um secreto prazer se o acusassem de algum delito amoroso, e não defenderia com extremo calor a sua inocência, contradição que parece algum tanto absurda, mas que era natural.
Como Félix não lhe animasse a conversa no terreno em que ele a pôs, Viana entrou a elogiar-lhe os vinhos.
— Onde acha o senhor vinhos tão bons? perguntou depois de esvaziar um cálice.
— Na minha algibeira.
— Tem razão; o dinheiro compra tudo, inclusive os bons vinhos.
A resposta de Félix foi um sorriso ambíguo, que podia ser benevolente ou malévolo, mas que pareceu não produzir impressão no hóspede. Viana era um parasita consumado, cujo estômago tinha mais capacidade que preconceitos, menos sensibilidade que disposições. Não se suponha, porém, que a pobreza o obrigasse ao ofício; possuía alguma coisa que herdara da mãe, e conservara religiosamente intacto, tendo até então vivido do rendimento de um emprego