toda a espécie de fantasmagorias que lhe apareciam como fatos possíveis, virtuais.
Eram-lhe as horas de aula um bem triste momento. Não que fosse vadio, estudava o seu bocado, mas o espetáculo do saber, por um lado grandioso e apoteótico, pela boca dos professores, chegava-lhe tisnado e um quê desarticulado. Não conseguia ligar bem umas coisas às outras, além do que tudo aquilo lhe aparecia solene, carrancudo e feroz. Um teorema tinha o ar autoritário de um régulo selvagem; e aquela gramática cheia de regrinhas, de exceções, uma coisa cabalística, caprichosa e sem aplicação útil.
O mundo parecia-lhe uma coisa dura, cheia de arestas cortantes, governado por uma porção de regrinhas de três linhas, cujo segredo e aplicação estavam entregues a uma casta de senhores, tratáveis uns, secos outros, mas todos velhos e indiferentes.
Aos seus exames ninguém assistia, nem por eles alguém se interessava; contudo. foi sempre regularmente aprovado.
Quando voltava do colégio, procurava a madrinha e contava-lhe o que se dera nas aulas. Narrava-lhe pequenas particularidades do dia, as notas que obtivera e as travessuras dos colegas.
Uma tarde, quando isso ia fazer, encontrou Dona Laura atendendo a uma visita. Vendo-o entrar e falar à dona da casa, tomando-lhe a bênção] a senhora estranha perguntou: "Quem é este pequeno?" - "E meu afilhado", disse-lhe Dona Laura. "Teu afilhado? Ahn! sim! É o filho da Gabriela..."
Horácio ainda esteve um instante calado, estatelado e depois chorou nervosamente.
Quando se retirou observou a visita à madrinha:
— Você está criando mal esta criança. Faz-lhe muitos mimos, está lhe dando nervos...
— Não faz mal. Podem levá-lo longe.