— Pois sim, vou mandar ver; - e foi-se para a ponta do fundo, lento e derreado, tossindo.
Paulo ficou um momento hesitante, a olhar; ouviu o estralar de um móvel e um resmungo na saleta onde entrara o delegado. Já com o chapéu na mão esteve ainda indeciso, como à espera de uma resposta, até que, desanimado, dirigiu-se à ponta, correu o reposteiro e saiu. "Vou mandar ver!..." E, repetindo as palavras do delegado, desceu as escadas, indignado e desesperançado.
Chovia ainda. Carroças desciam a rua, aos solavancos, atroando o silêncio. Parado, com o olhar disperso, numa inércia acabrunhada, como esquecido do seu próprio ser, ficou um instante à porta, até que a frase indiferente do delegado repontou: "Vou mandar ver..." Teve um risinho irônico; voltou-se para a escada, com ódio, repetindo entredentes: "Vou mandar ver..." Impetuosamente abriu d'estalo o guarda-chuva, e ia, de novo, lançar-se a caminho, quando viu um tílburi, que se aproximava vagaroso, ao passo tardo de um sendeiro esgrouviado, pobre besta noctâmbula, velha e exausta, que só àquelas horas ermas, de trevas, saía com a ossada e o mormo, para a tarefa que lhe valia o pasto e o abrigo na cocheira, até que, de todo inútil, fosse tocada pelos moços e achasse um canto para morrer, ao claro sol, sob o azul macio do céu. O cocheiro perguntou, em voz pigarrenta: "Para onde?" e Paulo, deixando-se cair na almofada, deu-lhe o endereço.