Na vizinhança, uma voz de mulher cantava; estalavam roupas batidas e, de instante a instante, eram berros de locomotivas que chegavam, que partiam, arrastando comboios. Ficou debaixo do chuveiro, hesitante, com frio; esteve um momento parado a olhar o crivo que pingava, depois uma aranha, que se balançava na teia, a um canto, junto à caixa d'água; por fim, resoluto, puxou a corrente e a água jorrou copiosa. Refrescado, saltou para a tábua e, envolvendo-se na toalha, pôs-se a esfregar-se. Vestiu-se, calçou os tamancos e saiu.
Passando pela cozinha recomendou à Felícia que lhe arranjasse qualquer coisa para almoçar: um bife e ovos - e, apressado, fechou-se no quarto para vestir-se. As botinas estavam encharcadas; tomou uns sapatos amarelos e surpreendeu-se a assobiar, esquecido da agonia que lhe toldava a vida, dantes tão calma e feliz naquela casinha alegre. Vestido, mirou-se rapidamente ao espelho, compôs a gravata e passou à sala de jantar.
Felícia estendera a toalha e já o prato o esperava. Sentou-se; e arrastando uma cadeira para junto dele, ficou a enrolar uma ponta da toalha, suspirando a espaços. Quando a negra apareceu com o bife e os ovos ainda rechinando na frigideira, Paulo partiu o pão e pôs-se a comer às pressas, sem levantar os olhos. Cigarras chiavam nas árvores vizinhas e na rua um vendedor de frutas prolongava um pregão monótono.