porta, que estava toda tomada por outro funeral, onde havia frades, escudeiros com círios em torno de um caixão, cujo pano de veludo tinha um brasão bordado. Então, todo o dia percorreu as ruas, socorrendo os que caíam, desviando os mortos do meio das calçadas – e ao escurecer já se tornara tão familiar, que das gelosias gritavam: “Eh homem!” Ele vinha, carregava os mortos para a vala, limpava a imundície dos pátios, corria a encher as bilhas de água – e mesmo alimentava as crianças que estavam sozinhas nos casebres.
Como em todas as casas havia um morto, e se receava o contágio, a multidão errava pelas ruas, entregue ao terror e ao delírio. As mulheres, os velhos, corriam às igrejas, a implorar às relíquias, saltavam por cima dos cadáveres que atulhavam os adros. Estes, julgando que o mundo ia findar, corriam às tabernas, arrombavam as pipas, e as blasfêmias dos ébrios juntavam-se ao pranto das mulheres. A cada esquina havia rixas – e por vezes, numa rua deserta, onde todos os moradores tinham morrido, Cristóvão tinha que expulsar os porcos, que roíam ossos humanos. De resto os animais, abandonados, percorriam as rua, e por vezes um cavalo espantado, um touro fugido do matadouro, corriam, esmagavam a gente, e era Cristóvão que os segurava com os seus punhos enormes.
A cada instante os gritos dos doentes abandonados