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Gozam ainda de muitos outros privilegios, porque lhes é permittido o namorar as raparigas livres, sem risco algum, olhar mesmo para as raparigas de seo senhor e senhora, si quizerem, e n’isto não ha muita recusa, comtudo ellas buscam os mattos e em certas cabanazinhas os esperam em hora marcada, para evitar pequeno remoque que costumam a fazer das moças de boa raça, quando se entregam a escravos, o que serve antes de riso do que de deshonra.

Vão livremente aos Cauins, e dansas publicas, enfeitando de mil maneiras o seo corpo quer com pinturas, quer com pennas, quando podem, pois estas são muito caras.

Vivem com os filhos de seos senhores, como si fossem irmãos, e em breve tempo gozam muita liberdade no seo captiveiro.

 


CAPITULO XVII

Quanto são misericordiosos os selvagens para com os criminosos por acaso e sem malicia.


Entre as perfeições naturaes que a experiencia me tem mostrado n’estes selvagens, nota-se uma justa misericordia, isto é, desejam a punição dos maus, quando por maldade praticam algum crime, e ao contrario são compadecidos e pedem misericordia para aquelles, que por acaso ou inadvertidamente incorrem n’alguma falta, e isto vou provar á vista do seguinte exemplo.

Maioba é uma grande aldeia, distante tres leguas do Forte de São Luiz: o seo Principal é um bom homem, amado pelos francezes, e veio fazer a nossa casa.