as sentira quentes, silenciosas, e não podia crer que uma vida quase adolescente possuísse já a arte da hipocrisia.

Não há vida tão física ou tão alheia ao sentimento da personalidade, que em tal situação não padecesse, ao menos, trinta minutos de insônia. A insônia de Jorge durou mais algum tempo. De envolta com as conjeturas havia um pouco de satisfação pessoal. A certeza ou a probabilidade de que, sem nenhuma ação própria, iniciara nos mistérios do amor uma alma ainda nova e ingênua, dava ao coração dele alguma coisa da volúpia do egoísmo; sensação que, aliás, diminuiu quando lhe ocorreu que, talvez esse amor obscuro lhe houvesse já custado lágrimas e desesperos. Ele tinha razão quando dizia não ser espírito vulgar. Afrouxara-se-lhe o ardor dos primeiros tempos, a imaginação tinha o vôo mais curto; mas a generosidade juvenil ficara intata, e com ela a faculdade de ressentir as dores alheias.

— Pobre menina! dizia consigo.

No dia seguinte, Jorge examinou retidamente se lhe convinha tornar à casa de Luís Garcia, ao menos com a assiduidade do costume. A situação moral de Iaiá tendia a agravar-se com a presença contínua dele; em tais casos, a ausência