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I

Eu não escalo as rochas de granito,
Eu não transponho as vastidões do mar,
Nem vou rasgar o ventre do infinito,
Passo a existencia, inerte e sem pensar.

Não sei se Deus existe, ou se é um mytho,
Imposto á crença para atormentar
Da humanidade o largo peito afflicto,
Em noites de negrume, sem luar.

Vivo n'uma anciedade indefinida,
Cheio de Raiva, ensanguentado e vil,
Sem mesmo comprehender o que é a vida,

Ai! talvez seja um lugubre covil,
Uma passagem horrenda e dolorida
D'um mundo mau a um outro mais gentil.

II


Talvez seja uma ponte arremessada
D'um nada a outro nada incomprehensivel,
Talvez seja uma nota não tangivel
Na harpa pelo Destino dedilhada.

A vida... talvez seja uma enseada,
Onde aporte, na furia inconcebivel
Dos elementos mil do Incognoscivel,
Noss'alma, sem timão, desarvorada.

Deixae livre correr a phantasia,
O' sabios que arrancaes á terra fria
Os mysterios de toda a immensidade...

Que a morte, poderosa como o incendio,
De vós rirá, com forte vilipendio,
Levando-vos talvez á Eternidade.