Os olhos dois de Belisa,
Em seu rosto amor compara,
Seu rosto flores-de-lis,
Seus olhos Pares de França.
Com mui soberbos rigores,
Com mui feras ameaças
São dois valentões de luzes,
Dois espadachins de graças.
Línguas de fogo parecem,
Em que meu peito se abrasa.
Línguas são, pois falam mudas,
De fogo, pois vibram chamas.
Dizem que o Céu competindo
Lhe deu, chegando-lhe à cara,
De luzes dois beliscões,
De estrelas duas punhadas.
E desta briga formosa
Bem que as luzes da Muchacha
Não ficaram desairosas,
Ficaram dali rasgadas.
Outros dizem que a menina
Foi contra Amor tanto irada,
Que arrancara a Amor os olhos,
Que os olhos de Amor roubara.
Mas se por força os não dera,
Sempre sentira a desgraça;
Pois quando a Muchacha vira,
Logo de amante cegara.
De sorte que desta perda
Como envergonhado estava,
Quis adornar-se ũa venda
Por disfarçar ũa mágoa.
E daqui vem que seus olhos,
Que ao cego arqueiro tomara,
Frechas despedem de amores,
Prisões solicitam de almas.
Não se queixe o deus Cupido,
Pois o império lhe dilata,
Esgrimindo aqueles furtos,
Fulminando aquelas armas.