Ingrata porque motivo
Cruel pódes duvidar
Desse fogo lento e vivo
Que é hoje o meu penar!
Foste tu que m’o accendeste
Que desses olhos quizeste
Que eu bebesse o seu fitar! —
Qual mimosa e casta flôr
Desfolhada pelo vento —
Assim me roubaste o amor —
Que é hoje o meu tormento.
Neste martyrio de dôr
Inda queres com rigôr
Escaldar meu pensamento!
Queres provas de que te amo?
Desprende dos labios teus
Um desejo que m’inflammo
Mostrar nelle os votos meus!
Exiges de mim a morte?
Em tuas mãos a minha sorte
Entreguei perante os Céus!
Dize, falla, manda, ordena
Com tua casta isenção
Aos tormentos me condemna
Que nunca direi que não —
Quer vivendo leda vida,
Quer em sorte desabrida
Será teu meu coração!